n. 13, vol. 1, jan. 2021

APRESENTAÇÃO

O ano de 2020 marcou uma década da morte de José Saramago, e nele comemoramos os quarenta anos de publicação de Levantado do Chão e os vinte anos de lançamento de A Caverna. Como parte das atividades do projeto O Ateu Amoroso: a compaixão pelo sofrimento imposto pelo homem aos animais na obra de José Saramago, o Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo promoveu, nos dias 17 e 18 de dezembro de 2020, um seminário virtual que contou com a presença de acadêmicos portugueses e brasileiros. Após as boas-vindas do diretor do IEA-USP, Guilherme Ary Plonski, o evento registrou a abertura memorável da presidente da Fundação José Saramago, a jornalista, escritora e tradutora ibérica Pilar del Río, nome que dispensa maiores apresentações. Todas as palestras ministradas no evento, a que demos o nome de “Celebrando José Saramago”, podem ser acessadas na íntegra na midiateca do IEA-USP.

A maior parte daquelas apresentações foi transformada nos artigos que integram este dossiê. Alguns dos artigos resgatam, aprofundando-o, o conteúdo original das palestras, enquanto outros trazem análises de obras de Saramago que não haviam sido abordadas no evento; todos representam contribuições originais à fortuna crítica do mestre português.

Em “Memorial do convento: o assalto à caixa-forte da História”, Ana Paula Arnaut nos mostra como Saramago —  neste que é considerado por muitos críticos e leitores seu melhor romance —  resgata os heróis anônimos da história portuguesa em uma narrativa ideológica em que a imaginação prodigiosa do autor “substitui o que foi pelo que poderia ter sido.”

Apoiando-se no discurso do autor sobre sua própria escrita, Carlos Reis —  em “Para uma teoria da figuração em José Saramago”, parte de um grandioso trabalho ainda em desenvolvimento — analisa diversos aspectos relacionados às personagens saramaguianas, desde sua gênese (que por vezes remonta a suas crônicas) e seu trajeto autônomo ao longo de um romance até seu significado como figura ficcional.

“‘O primeiro som’: José Saramago e o (longo) caminho à palavra” é um ensaio em que Horácio Costa —  tomando como exemplo o relato “O Ouvido”, contribuição de Saramago à coletânea de contos Poética dos cinco sentidos (1979), de que participaram diversos autores portugueses — analisa o uso que o escritor faz da “palavra poética” como resultado de seu longo período de experimentação com diferentes gêneros literários.

“Como desenhar um elefante” procura analisar a visão que têm de Salomão — o adorável elefante cujo transporte em caravana de Portugal a Viena em meados do século XVI é narrado em A viagem do elefante — os diversos personagens e o próprio autor-narrador, levando em conta a biologia desses simpáticos paquidermes, e a compaixão expressa pelo autor pelo sofrimento dos animais presentes na narrativa.

No ensaio, “José Saramago, cronista”, utilizando como pontos de partida trechos selecionados de A bagagem do viajante, Folhas políticas e O caderno, Jean Pierre Chauvin propõe aproximações entre textos dos diferentes gêneros cultivados por Saramago ao longo de sua rica trajetória literária, incluindo anotações em diário, memórias, crônicas e romances.

Em “Caim, de José Saramago, entre o mal e o bem”, Marcelo Lachat pretende demonstrar como o autor, em seu derradeiro romance, dessacraliza o Antigo Testamento reescrevendo — com seus tradicionais humor e ironia — a história bíblica do primogênito de Adão e Eva, enquanto entrega aos leitores sua última crítica à moral judaico-cristã.

Preparando-nos para a grande efeméride que há de iluminar os céus literários dos dois hemisférios em 2022 — o centenário de José Saramago — deixo aqui as palavras que Pilar del Río concedeu ao Jornal da USP, em edição publicada em 15 de dezembro de 2020 e que apresentava ao público justamente o evento a que nos referimos no primeiro parágrafo:  

“José Saramago olhava o mundo, lia e escrevia sendo a pessoa que era: um pensador humanista a quem nada lhe resultava alheio. Não foi mudando com o tempo, embora as circunstâncias da sua vida tenham mudado. Foi sempre um ser humano que escrevia olhando o mundo com a mesma curiosidade, a mesma compaixão e energia.”

Jaime Bertoluci

SUMÁRIO

Memorial do convento: o assalto à caixa-forte da História
ANA PAULA ARNAUT
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Para uma teoria da figuração em José Saramago
CARLOS REIS
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“O primeiro som”: José Saramago e o (longo) caminho à palavra              
HORÁCIO COSTA
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Como desenhar um elefante
JAIME BERTOLUCI
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José Saramago, cronista
JEAN PIERRE CHAUVIN
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Caim, de José Saramago, entre o mal e o bem
MARCELO LACHAT
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* Os textos estão em formato PDF.  Ver edição completa.